Hugo Oliveira Vicente
Tutor

Entrevista

Hugo Oliveira Vicente é Senior Product Designer na Farfetch e tutor da EDIT.. Neste entrevista destaca a necessidade das marcas se transformarem e se adaptarem ao digital e o facto da comunicação ser cada vez mais unificada em torno de projectos 360º.

No digital, temos um papel único, de mediação entre utilizador e processos cada vez mais automáticos e digitais, mantendo emoção e personalização na comunicação.


Fala-nos um pouco do teu percurso académico e profissional. Como surgiu o interesse pela área do Design, e especificamente pelo UX/UI?

Comecei a trabalhar com um grupo de colegas de faculdade num atelier que se chamava ink. Mais tarde vim para Lisboa, onde passei por alguns ateliers e agências, em projetos cada vez mais ligados ao digital. Profissionalmente, destaco a minha passagem pela EuroRSCG (Havas Digital) e pelo Global Media Group, onde atualmente coordeno a equipa de UX/UI Design. Apesar do meu percurso profissional em atelier, sempre procurei trabalhar em projetos de intervenção artística, de que são exemplo a colaboração com o designer de moda Filipe Faísca, o projecto LaGa Bags e o projecto INDEX. As minhas grandes referências são, no design gráfico, os designers Sebastião Rodrigues, Ricardo Mealha e os Why Not Associates, em projetos digitais os UVA – United Visual Artists e a Fantasy.

Hoje em dia interessam-me projetos interativos que utilizem o corpo como dispositivo. Utilizo o java e o Processing para criar experiências interativas, quer pela deteção de movimento, quer através do reconhecimento de rostos. Esta área de human computer interaction é extremamente interessante e está a fazer o seu caminho entre a ciência e a arte.


De que forma foi relevante para ti a experiência profissional no estrangeiro?

Apesar de curta, aprendi imenso do ponto de vista humano e criativo, tive a oportunidade de trabalhar com alguns dos maiores criativos brasileiros como o Mauro Perez e o Marcelo Aragão. Fiz amigos. Foi surpreendente, porque julgo que nós, portugueses, temos uma visão muito curta do design e da publicidade que se faz no Brasil, que está muito avançada mesmo no digital. Julgo que temos muito a aprender com o que se faz do outro lado do Atlântico.


 Como é um dia da tua rotina de trabalho atualmente?

Grande parte do meu dia é passado em discussões sobre a usabilidade e a experiência de utilizador nos nossos sites. Todos os dias procuramos fazer ajustes e inovar, com soluções que tornem a vida dos utilizadores mais fácil, mas que também lhes permitam encontrar a informação que procuram mais rapidamente, gerando em simultâneo retorno para a empresa.


Na tua opinião, quais são os principais desafios do processo criativo?

Hoje em dia o principal desafio é a conjugação da criatividade com a inovação e os objetivos do cliente para a sua comunicação, seja no papel ou no digital. Por outro lado, um dos grandes desafios que todos enfrentamos é económico: temos que provar todos os dias que o design é valioso para uma empresa e um gerador de negócio.

O processo de design tem-se afastado de uma visão autoral, passando para uma visão mais colaborativa. O autor de um projeto, hoje, não existe: todos os stakeholders que participam no desenvolvimento do projeto e o levam a bom porto são os seus autores. Por outro lado também não existe uma resposta única para cada problema, e esta nova forma, mais diversa, de ver o mundo, os problemas e as soluções, coloca, num primeiro olhar, em causa o papel do design, porque está mais sujeito a criticas. Contudo, e apesar disso, também torna o papel do designer mais importante – como um mediador, mas no final de contas também o decisor, porque é a ele que cabem as decisões fundamentais e as opções do projeto.


E pela tua experiência, como vês a área do design digital hoje em dia em Portugal? Qual a perspetiva de evolução?

Vimos o desaparecimento de grandes agências de publicidade e design, aquelas que durante anos foram uma referência nesta área, em grande parte porque não se souberam transformar e adaptar ao digital. Ao contrário do que acontecia antes, o design não tem apenas de criar marca, tem de provar que as suas propostas geram valor para as empresas, para os clientes e para os utilizadores.

Vemos também que a comunicação é cada vez mais unificada em torno de projetos 360º, e este é o caminho de transformação que os designers hoje devem atravessar –  devem saber criar em papel, no digital, nas redes sociais e ainda dominar e perceber o código e os algoritmos por trás das máquinas. No digital, temos um papel único, de mediação entre utilizador e processos cada vez mais automáticos e digitais, mantendo emoção e personalização na comunicação.


E sobre a experiência do utilizador, consideras que é um fator determinante nos projetos desenvolvidos em Portugal, e que as empresas o reconhecem como tal?

Estamos a percorrer um caminho no sentido de dar foco ao utilizador, mas este ainda é um percurso longo, sobretudo no que diz respeito às tomadas de decisão. Mas é um percurso que estamos a fazer em conjunto com as empresas, com determinação, e que é imparável.

O UX/UI Design está a ter um reconhecimento tardio, mas merecido. O UX é essencial no digital, sobretudo porque traz a ciência ao design e torna o processo mais compreensível para o cliente, ao mesmo tempo que apoia o designer nas suas tomadas de decisão e no desenvolvimento do projeto. Obriga a uma clarificação do processo criativo e das escolhas de design, o que valoriza o UX/UI designer e o reconhecimento do seu papel por parte das empresas.


Quais são, na tua opinião, as principais características de um bom exemplo de user interface?

Todo o trabalho que está por trás, ou seja, todo o trabalho de user experience. No livro O Principezinho, de Saint-Exúpery, existe a frase “O essencial é invísivel aos olhos”, uma frase extraordinária e que penso se aplica aquilo que podemos considerar um bom user interface. O user interface design e a user experience não vivem um sem a outra: se o user interface é o corpo/a forma, a user experience é a alma por trás de cada projeto.


E de user experience?

Tenho que destacar o site do The Guardian, e todo o processo que levou ao seu desenvolvimento. A importância dada à experiência do utilizador, assim como do design no projeto final, fazem deste site uma das minhas referências atuais.

Por oposição, a recente renovação do Portal das Finanças colocou a nu o que pode ser considerada uma má experiência para o utilizador: o site está mal organizado, tem uma péssima arquitetura de informação e é praticamente impossível chegar onde se pretende; o site transformou-se num labirinto frustrante, de difícil navegação, apesar de ser uma plataforma essencial para todos os cidadãos. Seria um desafio repensar e trabalhar num projeto com o impacto deste.


Podes destacar um ou dois trabalhos que te deram especial gosto  trabalhar /participar?

A marca com que gostei mais de trabalhar foi o Continente, concretamente no projeto Chef Online. Quando foi lançado, este projeto tinha por objetivo ser o primeiro site em vídeo a nível nacional, em que toda a navegação era feita em vídeo, desde a seleção dos ingredientes à receita. Foi um grande desafio de design e técnico, que recebeu muitos prémios nacionais, entre os quais três do Clube de Criativos.

Mais tarde veio o projeto da aplicação para iPad do Diário de Notícias, que recebeu grande reconhecimento internacional, destacando-se o Mobi Award, que vencemos contra marcas como a National Geographic e a Bloomberg.

Por último, destaco o lançamento dos novos sites Jornal de Notícias, O Jogo e Dinheiro Vivo.


 Para quem quer saber um pouco mais sobre as áreas do Design Digital e do UX/UI Design, que recursos aconselhas?

Aconselho o essencial The Design of Everyday Things de Donald Norman, e o livro Don’t Make Me Think de Steve Krug. Para quem quiser saber mais sobre tipografia, Stop Stealing Sheep and Find Out How Type Works, por Erik Spiekermann.

 


Já fazes parte da equipa de tutores da EDIT. já algum tempo. Que aspetos destacas da experiência de ser tutor?

Na user experience da tutoria? A experiência é fantástica, é um orgulho fazer parte de uma equipa de tutores que se destacam nas suas áreas, desde o UX ao design, passando pelo desenvolvimento até à gestão de projeto.

O feedback e a troca de experiências com os alunos é muito boa. Aprendemos todos com as experiências de cada um.

O prémio de Escola Criativa do Ano faz todo sentido e é inteiramente merecido, não apenas pela renovação e inovação que procuramos em cada semestre, como também pelos meios que temos ao dispor e que colocamos ao dispor de todos os que frequentam a escola.


Para concluir, que conselhos podes dar aos nossos alunos que pretendem entrar no mercado do Design Digital? Como podem diferenciar-se?

Work, Work, Work, Work. Que pensem pela sua cabeça, não vão atrás do que os outros dizem e de regras que foram feitas apenas para serem quebradas.



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