Margarida Carvalho
Tutora

Entrevista

Margarida Carvalho, User Experience Specialist na BIT - Sonae, tutora do programa UI & UX Design da EDIT., afirma, sobre a tua experiência na EDIT.:"Para mim, ser tutora é uma via com dois sentidos. Temos de nos manter objectivos, com a mente a aberta e ter a capacidade de fazer perguntas pertinentes que ponham os alunos a pensar, acabando por aprender com as respostas e as partilhas deles."

"Quando uma empresa entende o valor da experiência do utilizador e o impacto que pode ter no negócio, os UX designers serão mais envolvidos."


Desvenda-nos um pouco do teu percurso profissional. Porque decidiste entrar na área da experiência do utilizador?

Eu comecei o meu percurso profissional na área do design gráfico num departamento de marketing e, como tal, aprendi a fazer de tudo desde flyers, a catálogos, merchandising, stands para feiras, etc. Até que houve a necessidade de fazer o redesign do site e foi nessa fase que percebi que preferia o design digital ao print. Também sempre tive um fascínio sobre a mente e o comportamento humanos. Quando me apercebi que era isso que eu gostava mais, desenho digital e estudar e observar as pessoas, mudei de emprego. Desde então que trabalho na área da experiência do utilizador. Já trabalhei em startups, numa non-profit e agora trabalho na Bit | Sonae e não mudava de profissão.


Como é a tua rotina de trabalho?

Eu não tenho uma rotina fixa de trabalho, as minhas tarefas diárias dependem dos projectos em que estou a trabalhar, e das fases em que estes estão. Tanto posso ter um dia em que tenho que preparar ou facilitar uma sessão de design thinking para se dar um impulso grande inicial no conceito de um novo produto da parte da manhã, como depois fazer os fluxos e wireframes de outro projecto da parte da tarde. Como tenho um conjunto de tarefas e projetos variados, a única tarefa que é certo fazer parte da minha rotina é organizar o meu dia. Por norma, é a primeira coisa que faço, depois do café, se não o tiver feito no dia anterior.


Fontes de inspiração e desafios. Quais são os teus?

Tenho alguns nomes e sites de referência que sigo mais atentamente como o do Nielsen Norman Group ou Baymard Institute, entre muitos outros. Também posso referir a Dr. Susan Weinschenk (também conhecida como “The Brain Lady”) que mostra como utilizar a ciência comportamental para entender, prever e direcionar o comportamento das pessoas quando interagem com produtos digitais.

No que diz respeito a desafios, penso que o meu grande desafio tem sido fazer com que os profissionais de áreas adjacentes com quem trabalhamos todos os dias percebam o valor de conhecer as pessoas para as quais criam produtos e serviços.

 


Consideras que a experiência do utilizador é um fator determinante nos projetos desenvolvidos pelas empresas? Qual o ponto da situação desta área em Portugal? E lá fora, qual é a tendência?

Sim, considero que é um factor determinante nos projectos desenvolvidos pelas empresas. Se o produto resolver realmente as necessidades dos utilizadores e for de encontro aos seus modelos mentais e preferências, a sua adesão ao produto, conversão e depois retenção vai ser muito mais elevada fazendo com que a receita das empresas seja maior também. Utilizadores ou consumidores satisfeitos vão utilizar mais o produto, vão voltar e vão mais além, vão querer partilhar a experiência.

Em Portugal, a área da experiência do utilizador é, sem dúvida, uma área em crescimento principalmente nos últimos anos e na área digital. Contudo, na minha opinião, estamos numa fase diferente do que já se faz lá fora, especialmente no que diz respeito a métodos de trabalho e à importância e ao reconhecimento do valor que se dá à area da experiência do utilizador.

Em Portugal ainda se confunde muito experiência do utilizador e design visual, dando-se primazia ao aspecto visual, não se investindo tanto na parte de conhecer os utilizadores e testar os produtos com eles. Lá fora já existe uma foco maior nesta questão e também se vê um caminho ligado a incluir experiência do utilizador noutras áreas além da digital, como a área de serviços (service design) por exemplo.


Que evolução prevês na profissão de um UX designer?

A profissão de UX Designer tem tido alguns desafios tanto ao nível do papel que desempenha no ciclo de desenvolvimento de um produto como ao nível da influência e impacto que tem nas organização em que se encontra inserido.

Na minha opinião, para permanecer relevante, o UX Designer deve ir redefinindo o seu papel e responsabilidades na organização em que está, assumindo de forma proativa o seu futuro. Quando uma empresa entende o valor da experiência do utilizador e o impacto que pode ter no negócio, os UX designers serão mais envolvidos na estratégia de produto e nos processos de tomada de decisão que lhe são inerentes.

Posto isto, penso que cada vez mais o UX designer deve ser visto como facilitador do processo do desenho de produtos e serviços em equipas multi-disciplinares, assumindo por outro lado uma posição mais estratégica.


Indica-nos uma ou duas plataformas que, na tua opinião, se destacam ao nível do design de experiência.

Na minha opinião, uma plataforma para ter um bom design da experiência dever ser útil e satisfazer uma necessidade real dos utilizadores; deve ser fácil de compreender, navegar e utilizar e deve agradável para quem a usa. Neste sentido, destaco o Duolingo e a Asos.

O Duolingo é uma plataforma de aprender línguas com uma componente de gamificação muito forte. Tanto o site como a app são fáceis de utilizar, os exercícios são simples de compreender e é fácil de perceber como se progride. A forma como aplicam a gamificação encoraja a interação e o envolvimento dos utilizadores fazendo com que estes invistam o seu tempo no site, tornando a tarefa de aprender uma língua nova não só fácil como interessante e agradável.

A Asos é uma plataforma de e-commerce. É muito simples de se navegar e de encontrar o que se procura, pois tanto a navegação como o sistema de pesquisa são muito eficazes. O processo de checkout também é simples, apesar de pedir registo. Além disso, ao nível visual, há uma aposta forte em imagens de qualidade.


Que recursos recomendas para quem se quer manter atualizado nesta área? Indica-nos dois livros de referência que permitam aprender um pouco mais sobre a mesma.

De forma geral, e sendo esta uma área em constante evolução, é bom que os UX Designers se mantenham atualizados. Existem dezenas de listas de recursos disponíveis online e grátis, não há desculpa!

Menciono três dos sites que sigo: UxBooth, UxMag e UxMatters. São sites com artigos sempre atuais que cobrem praticamente todo o espetro de temas dentro da área da experiência do utilizador.

Para mim, dois livros de referência são: O “100 Things Every Designer Needs to Know About People” da Susan Weinschenk e o “Measuring the User Experience: Collecting, Analyzing, and Presenting Usability Metrics” do Thomas Tullis & William Albert.


Destaca um ou dois trabalhos que te deram mais gosto realizar/participar.

Em 2015 tive a oportunidade de fazer um estudo de user research e testes com utilizadores no Quénia e na Nigéria. Estava a trabalhar numa plataforma de reserva de hotéis para África e foi um trabalho que me deu muito gosto fazer. Ter a oportunidade de conhecer e entrevistar utilizadores, entender os seus modelos mentais no que diz respeito à reserva de hotéis, verificar que as diferenças culturais têm impacto em aspectos do produto que não estava à espera. Observá-los a usar o produto e perceber que estávamos a assumir coisas menos certas, que não iam de encontro à forma como os utilizadores pensam ou esperam que o produto reaja e às suas preferências. Foi realmente uma experiência muito esclarecedora que permitiu depois ter dados para adaptar o produto de modo a ir ao encontro das expectativas dos utilizadores.


Há alguma meta profissional que gostasses de cumprir nos próximos tempos?

Sim. Em tempos comecei a escrever no Medium sobre diferentes tópicos da área da experiência do utilizador, tópicos que se calhar não conseguia abordar no dia a dia do trabalho mas que me inspiravam e pelos quais tinha muita curiosidade. Entretanto, com a azáfama do dia a dia acabei por parar. Gostava de retomar a escrita nos próximos tempos.


O que gostas de fazer nos teus tempos livres?

Nos tempos livres, gosto de imenso de viajar e de ler. A última viagem foi à Rússia e países do Báltico. Sou também uma devoradora de livros assumida (e-books ou em papel). O último livro que li foi o “Tuesdays with Morrie” do Mitch Albom, dos melhores livros que li nos últimos anos. Como ser social que sou, gosto estar com os amigos e a família e apanhar ar puro.


Como é ser tutora na EDIT.? Que aspetos e contributos destacas nesta experiência?

Ser tutora na EDIT. tem sido uma experiência enriquecedora tanto a nível pessoal como profissional. Tive a oportunidade de conhecer pessoas fantásticas, aprendi quase tanto como ensinei e é isso que eu destaco nesta experiência. Para mim, ser tutora é uma via com dois sentidos. Temos de nos manter objectivos, com a mente a aberta e ter a capacidade de fazer perguntas pertinentes que ponham os alunos a pensar, acabando por aprender com as respostas e as partilhas deles.

Pensa-se que os tutores só ensinam e guiam, mas a verdade é que aprendemos tanto com as experiências uns dos outros.


Como está o mercado atualmente a nível de profissionais na área da experiência do utilizador? Quais os maiores desafios que se enfrenta ao entrar neste mercado?

O mercado em Portugal está a crescer, tem havido sem dúvida um aumento de ofertas nos últimos anos. Contudo, devido à novidade do campo e o relativo desconhecimento que ainda envolve a profissão de UX Designer, as empresas podem esperar coisas muito diferentes do trabalho de UX. Muitas vezes, as próprias empresas não sabem muito bem o que pretendem e o que faz um profissional de UX. Ao mesmo tempo, a diversidade de perfis dos profissionais é grande e é importante que exista uma correspondência entre o perfil do candidato e o que a empresa pretende. Na minha opinião, este é o primeiro desafio.

Outros grandes desafios passam por saber criar valor ao traduzir os entregáveis de UX em objectivos de negócio e por educar os nossos colegas para a importância e valor do nosso trabalho e contribuição, para o facto de fazermos mais do que pôr as “coisas bonitas”. Além disso, ainda há a questão de defender constantemente os utilizadores, e conhecê-los e às suas necessidades.


Podes deixar um conselho para os nossos alunos que pretendam integrar o mercado digital na área do UX design?

Procurem uma posição que se adapte aos vossos pontos fortes. Sejam curiosos e façam por estar sempre a aprender. Procurem maneiras de partilhar o vosso trabalho, mesmo que ainda esteja em progresso. Não tenham receio de mostrar o vosso trabalho, colaborar com outras pessoas que não designers e de pedir/receber feedback, só assim se cresce e evolui.



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